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terça-feira, 20 de fevereiro de 2018

A maior queda é a em si mesmo


Peguei o atalho
onde não havia
orvalho frio...
das madrugadas
livros
igrejas
a lei dos homens
a lei de Deus
e onde fica
a lei do eu?
eu tão cansada
eu tão sozinha
eu tão mesquinha
querendo tudo
o mundo mudo
cego meu guia
mesmo de dia
academias
personal trainer
no meu divã
sem cara limpa
que eu não sou besta
me maquiei
pra te encontrar
e implorei o
status quo
e nem notou
a cara falsa
vagina seca
com vaselina
não me ensina
a ser mundana
pois sou uma dama
interpretando
o script imundo
de um mundo cão
eu sem perdão
num mundo vip
sonhos de valsas
nas madrugadas
de cinderela
ódio
amor
quanto me custa
o verdadeiro?
quanto dinheiro
pra te manter
sempre sorrindo
nas indas e vindas
dessa mentira
que cega a gente
mas ser contente
não pude ser
até eu ver
desconfiada
me beliscando
será um sonho?
caí em mim
muito abatida
tanta intriga
pra ser feliz
a lei dos homens
me castigando
você olhando
tô nem aí
no meu nariz
a ilusão
nenhum irmão
nenhuma mão
apenas o chão
e eu caída
juntando a vida
restos de mim
te perguntei
desconfiada
você me quer
depois de tudo?
mas ele mudo
me levantou
e lá no fim
me disse sim
é lei de Deus.



Renildo Borges

sexta-feira, 16 de fevereiro de 2018

Sui Generis



Eles me deixaram aqui fora
Trancaram a porta com risos
De hienas na carniça
(dízimo e ofertas)
Só por que não concordei
Em pagar pra ir pro céu
No mar da incoerência
Numa velha arca furada
Guiadas por quem tem olho e não vê
E aqui fora tem o céu
falei com quem mora lá
e não puderam tomar o céu
nem o livre arbítrio que ele me deu



Tomaram os livros sagrados
E incendiaram o ódio
(Mentira x Verdade)
Mas não puderam tomar
os velhos sábios
(que Deus esconde dos malditos)
Que encontro nos caminhos
Me falam sempre baixinho
(mato tem olho e parede tem ouvido)
Dos desvios que cortam caminhos
Pra se desviar do ódio
E encontrar o amor
E o amor não puderam tomar


Tomaram a minha comida
Mas alguém me deu sementes
Nem sei se (Ele) era gente
Tinha um olhar profundo
Com muita pena do mundo
(os homens em procissão
todos com velas na mão
adorando a mentira)
Me disse você tem o cheiro
O sabor
O paladar
Vá menino trabalhar
Isso não podem tomar


Tomaram meu cartão do sus
Um bando de urubus
Por que anulei meu voto
Cada botão que apertava
( aparecia um ladrão)
Com seu riso escrachado
Como se eu fosse burro
Confirmar pra ser roubado
Dei neles a maior canseira
Tomei chá de dormideira
figueira,alecrim cheiroso,
Melão de São Caetano
Que um raizeiro baiano
Me mostrou lá quintal
E quando não funcionava
Orava pra quem é dono
De mim ,de ti e do mundo
Pra confirmar se eu vivo.


Tomaram vergonha na cara?
Não!
Os medíocres não conhecem a vergonha.


Renildo Borges

Quando tudo do mundo falha


Meu filho mais novo
rebelde sem causa
andava nas ruas
pelas madrugadas
meu sono bem longe
também passeava
seguindo seus passos
em becos vazios
com cheiro de morte 

nas ruas do Rio


sentei
conversei
uma
duas
três...
Vezes
e a paciência...
o tempo...
a hora...
perdi meu emprego
com tanta demora


comprei celular
e dei de presente
para rastrear
saber onde estava
nunca respondia
nunca me ligava
pra um velho idiota
covarde o bastante
(ou será que é amor)
podia mandá-lo
embora num instante
e tudo acabava
ficava só a dor
de vê-lo distante
da mãe e do pai
por entre as fileiras
dos que não voltam mais


um dia um homem
(não sei se de Deus)
sentado ao meu lado
eu nada lhe disse
mas ele falou
"orai sem cessar"
confie e espere
quando me vem o sono
eu ORO
e meu filho chega antes que
eu adormeça completamente.


Renildo Borges

Por onde o vento nos levou.


Já quis ser porto seguro
segurar em mim quem chegasse
já quis ser uma folha seca
ir por onde o vento levasse
já quis me esconder no escuro
pra clarear as ideias
 


já quis em alguns dias claros
esconder promessas velhas

mas devagar gira as horas
de quem espera ilusão
de quem voa em quimeras
caixa de pandora
prometeu
roubando o fogo que havia
no coração que era meu


Já quis ser alegre um dia
na ciranda dos que dançavam comigo
mas eu era uma rosa velha que
já não tinha perfume
minhas petálas
rublas de vergonha
caindo como a chuva
me afogando em tristeza
num lago de saudade em mim
do quis ser e nunca fui


Já quis ser apenas o gosto
em tua boca
e na minha
mas não a tua saudade
que chega à boca da noite
junto com a solidão
pra conversar e lembrar
de coisas que foi vontade
de coisas que foi paixão
por onde o vento nos levou
nos becos da ilusão
mas os hipócritas
(escondidos em suas madrugadas vazias)
sempre chamarão de pecado.


Renildo Borges

O tempo falará por mim

Quando eu era menino
ouvia aqueles homens
Com seus dedos em riste
Com suas vozes altas
Com seus ares de quem podia
Dar ordem ao meu pai
de forma brusca
Que sempre obedecia
Raramente questionava
Dava vontade de perguntar
-Porque o senhor permite isso?
Mas eu assim como ele
também não tinha coragem
e assim seguia a vida na mesma ladainha
faça isso ,faça aquilo...



um dia lá pelos catorze anos
com a paciência esgotada
criei coragem e perguntei
meus irmãos se afastaram depressa
quando nosso pai nos encarou
pensei em correr também
mas fiquei ali preso
querendo sair e sem poder
as pernas tremendo
a boca seca
aquele bolo na boca do estômago
o medo da palmatória

meu pai percebeu a minha dificuldade
e desfez aquela cara medonha que nos assombrou
e se aproximou devagar
chamou meus irmãos e nos disse
da dificuldade de arrumar trabalho
por não ter estudo
e que precisava do dinheiro para nos sustentar
e então entendemos que aquilo era por nós
mas mesmo assim eu disse a mim mesmo
que não ia querer ter filhos e nem mulher
não ficaria preso aquela condição


e lá fui eu pelo mundo com a minha cara feia
e meus dois metros de altura
metendo a mão na cara
dos que achavam que eram
dos que queria me humilhar
dos que não tinham respeito
dos que queriam mandar


mas aos 29 anos
Ela apareceu
Com sua negra cabeleira
Com os seus olhos de vem comigo
como seu andar gingado
Ah,meu Deus! Eu tô lascado!
Com seu cheiro de amor...
Dia desses nosso filho mais velho perguntou:
-Pai ! Hoje não é domingo?
Olhei pro meu pai que agora mora conosco
Abaixei a cabeça e fui trabalhar
Por que sei que o tempo falará por mim


Renildo Borges