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quinta-feira, 7 de dezembro de 2017

Os mortos não riem jamais


Riram do tênis que minha mãe me deu
Da minha calça sem marca
Da minha camisa sem estampa
Do meu pulso vazio
Até tudo ficar sem graça
E abaixar a fumaça
Dos seus vícios que eu não tinha
Por que a mãe era minha
Sentada cansada ao meu lado
Olheiras,calos nas mãos
Eu lá dentro do seu coração


Riram dos recados dados
Por minha mãe para entrar
No meu celular barato
E me chamaram de fraco
E caíram no assalto
Que eu não quis participar
Por que minha mãe me disse
que o mais caro que existe
é ter a sabedoria de obedecer pai e mãe

Riram do Deus que eu tinha
Da favela de onde eu vinha
Dos meus livros emprestados
Por quem tem bom coração
e não viram a escravidão
com seus olhos doutrinados
pra ser apenas escravos
dos anúncios da tv

Minha mãe ainda me olha por cima
das lentes dos óculos
para não ter nenhuma interferência
de tua verdade tão limpa
-Cale a boca e me obedeça!
Quando de quando em quando
Volto ao meu velho lar e vejo
Lá fora nas esquinas do ontem
os velhos fantasmas dos meninos
picham os muros com uma frase triste
(os mortos não riem jamais)

Renildo Borges

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